Menu

As Mulheres à frente dos Vinhos de Altitude de SC

A vitivinicultura da Serra de Santa Catarina se destaca pelo terroir de altitude, qualidade dos vinhos finos e, também, por causa da quantidade de mulheres à frente das vinícolas. Das 22 empresas que integram a Vinhos de Altitude Produtores Associados, mais de 10 possuem mulheres no comando dos negócios ou operações das propriedades. Entre estas empreendedoras estão mulheres dando continuidade ao legado dos pais, impulsionando negócios familiares ou apenas inovando ao investir em uma área na qual são apaixonadas. 

Estas mulheres, assim como a madame Clicquot, fundadora da marca Veune Clicquot® na região Champagne na França, tiveram acesso ao vinho e construíram suas histórias com entusiasmo e dedicação. A viúva Clicquot assumiu após o falecimento do marido, no século XIX, um negócio falido e recuperou a empresa ao fabricar um champanhe que hoje é um dos mais conhecidos do mundo. Naquela época, a presença feminina no mercado de trabalho era algo inusitado, diferente do momento em que vivemos hoje, mas ainda assim somos minoria. 

Segundo a Síntese de Indicadores Sociais do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) - Uma análise das condições de vida da população brasileira, publicado em 2023, no ano anterior (2022) o nível de ocupação dos homens alcançou 66,3% e o das mulheres 46,3%. No campo, o último Censo Agropecuário, realizado em 2017 pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa); Embrapa e IBGE, identificou 947 mil mulheres responsáveis pela gestão de propriedades rurais. De acordo com a pesquisa, juntas elas administram cerca de 30 milhões de hectares. 


 

Mulheres na Vitivinicultura

Hoje, no século XXI, as mulheres se destacam no setor vitivinícola. Seja empreendendo e presidindo vinícolas, atuando no manejo dos vinhedos, na área comercial ou na enologia. No ano passado, pela primeira vez na história da Associação Brasileira de Enologia (ABE), uma mulher foi eleita como Enóloga do ano. Vanessa Stefani, do Rio Grande do Sul, conquistou o título 20 anos após a criação do concurso que, até então, havia reconhecido 19 homens.

Vanessa é uma das mulheres de destaque atuando no setor de vitivinicultura do Brasil. Na Serra Catarinense, outras profissionais atuam com maestria e determinação para tornar os Vinhos de Altitude de Santa Catarina reconhecidos e apreciados no país. 

Entre elas estão: Daniela Borges de Freitas, presidente do Conselho de Administração da Villa Francioni; as irmãs Carolina Rojas Ferraz e Patricia Rojas Ferraz da Vinhedos do Monte Agudo, atuando nas áreas de enologia e comercial e marketing respectivamente; Maristane Greter, proprietária da Vinícola Fama; Betina de Bem, enóloga e gestora Vinícola Quinta da Neve; e Thais Gobbi Dalvi Gaudio, responsável técnica de campo da Vinícola Gaudio. 

 

Uma história de acesso, capacitação, merecimento e respeito

Para ingressar em uma área, seja qual ela for, é preciso de acesso. Esse foi o fator determinante para as mulheres à frente dos Vinhos de Altitude de Santa Catarina traçarem uma história de sucesso. Ao ingressar na área, foi preciso estar à altura dos profissionais do setor e isso só é possível através da capacitação. Um longo e contínuo caminho traçado com dedicação que levou todas ao merecimento das conquistas alcançadas. E para valorizar a força feminina do setor vitivinícola, vamos conhecer um pouco mais sobre essas mulheres que elevam a Serra Catarinense e os Vinhos de Altitude de Santa Catarina a outro patamar. 

 

Daniela Borges de Freitas mantém a memória do pai viva na Villa Francioni

Daniela Borges de Freitas, é filha de Manoel Dilor Freitas, empresário da região Sul de Santa Catarina e fundador da Villa Francioni. Dilor foi um visionário que se encantou pela Serra Catarinense, comprou um terreno na região e apostou no primeiro experimento feito pela Epagri com uvas Vitis Viníferas de variedades europeias. O empresário elaborou um projeto grandioso, com cerca de 4.500m² de área construída e capacidade para produzir 300 mil garrafas por ano. Infelizmente, não conseguiu ver o sucesso da vinícola, pois faleceu em 2004 quando a estrutura estava quase pronta, mas deixou um legado para os filhos. “Antes de falecer, o pai convidou toda a família e nós fizemos uma viagem pela França, pelas principais regiões de onde sairia a inspiração para os nossos vinhos e, com isso, eu fiquei cada vez mais envolvida com o projeto”.

A participação em todo o processo de implantação do empreendimento fez Daniela Borges de Freitas assumir os negócios da família. Hoje ela é presidente do Conselho de Administração da Villa Francioni, onde atua desde 2008. A empresária afirma que gosta do negócio da mesma maneira que o pai gostava e que criou um envolvimento muito grande devido a memória afetiva que ele proporciona. “Foi um projeto grandioso e eu encaro como uma missão porque foi elaborado para ser uma âncora e uma inspiração para outras vinícolas se instalarem na região. Tanto que o pai construiu uma vinícola com uma capacidade de produção bastante alta para incentivar os produtores de uva a criarem os seus próprios rótulos ,e com isso,  criar um núcleo de produtores com potencial de elaborar esses vinhos finos de altitude. Um sonho que hoje a gente vê se consolidar”. 

Para Daniela, ser uma mulher à frente de uma vinícola nunca foi algo difícil. “Eu gosto muito de desafios, então quando recebi uma negativa, me esforcei para mostrar que a realidade era outra. Ouvi as pessoas  questionando o que uma mulher fazia à frente de uma vinícola e afirmando que isso era negócio para homens, mas eu nunca me abalei. A mulher precisa estar capacitada, estudar, eu sou uma pessoa que estuda muito, faço cursos, tenho uma formação direcionada também em Direito, e penso que é a capacidade intelectual e de trabalho que ditam o sucesso”, finaliza. 


 

Betina de Bem consolida a carreira na gestão da Quinta da Neve

Betina de Bem é filha de produtores de maçã da cidade de São Joaquim, cursou Agronomia na UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), se interessou por fruticultura e ingressou em um projeto realizado por um professor para desenvolver a parte de vitivinicultura da enologia que tinha vários projetos com a Epagri. Depois foi bolsista no Núcleo de Estudos da Uva e do Vinho e trilhou um caminho de sucesso na área. “Foi ali que eu me encantei pela economia, pela elaboração do vinho, pela produção da uva no campo, então eu terminei Agronomia, fiz estágio em vinícola, depois mestrado e doutorado em Viticultura e Enologia e atuei como professora”, lembra. 

Desde 2021, Betina é enóloga e gestora da Quinta da Neve. Ela foi procurada pelos proprietários da vinícola logo que retornou para São Joaquim e aceitou o desafio de estar à frente do empreendimento. Para ela, as mulheres têm um futuro promissor na vitivinicultura. “A mulher é mais sensitiva em usar os aromas, é mais detalhista e isso é uma vantagem dentro da enologia. “Fazer vinho é uma obra de arte e a mulher tem muitos atributos que podem ser utilizados na profissão”.

Quando Betina fala sobre a profissão é visível o amor que ela tem pela profissão.  Fazer o produto, assinar um rótulo e ver o resultado da dedicação de anos deixa a enóloga satisfeita. O reconhecimento do trabalho veio durante o Mondial des Vins Extrêmes 2023, uma premiação realizada no Valle d’Aosta, na Itália, onde a Quinta da Neve recebeu medalha de ouro pelo Pinot Noir Cuvée de safras 2021 e o Gran Prêmio Cervim 2023, maior pontuação do concurso, com o Touriga Nacional 2022. “Quando a mulher assume uma responsabilidade, ela é respeitada, tanto no campo, quanto na enologia. A gente precisa encarar os desafios e mostrar do que somos capazes, pois há espaço na vitivinicultura para as mulheres”, conclui. 


 

Capixaba Thais Gobbi Dalvi Gaudio domina o campo na Vinícola Gaudio

Thaís Gaudio é uma capixaba vivendo na Serra Catarinense que ingressou na produção de vinho por causa da paixão do marido, o Chef e Sommelier Paulo Gaudio. Naturais do Espírito Santo, eles tiveram a oportunidade de arrendar um vinhedo com 12 hectares na cidade de Urupema. “Quando a gente tocou a primeira safra foi o caos, porque a gente não conhecia nada de agricultura, conhecíamos muito de vinho, muito de mercado, mas não de agricultura. Foi quando eu entrei de cabeça no negócio”, relembra. 

O maior desafio do casal foi produzir a primeira safra, pois o marido de Thaís não se adaptou com o trabalho de campo, ao contrário dela que aceitou o desafio, assumiu a produção de uvas e começou a estudar. Hoje, a empresária formada em Administração está finalizando o mestrado em Viticultura e Enologia e é a responsável técnica de campo da Vinícola Gaudio. “Essa foi a primeira safra que eu toquei desde o início, do manejo ao tratamento, tudo foi por minha conta, e eu nem sei se eu faria outra coisa”. 

Os desafios de Thaís são grandes, mas encarados com leveza e coragem. Tudo isso porque ela acredita que as mulheres ingressam na área quando têm acesso. “De um modo geral, no mercado de trabalho, as mulheres foram chegando conforme elas foram tendo acesso às profissões. O vinho, por exemplo, não era acessível para as mulheres e, há 50 anos, muitas nem podiam beber. A viúva Clicquot, por exemplo, é um dos maiores casos de sucesso de uma mulher que assumiu a vinícola quando o marido, quebrado, morreu e ela teve que sustentar a família. E eu acho que com outras tantas mulheres a situação é a mesma, a gente vem acompanhando a história”.

 

Irmãs Carol e Patty Ferraz inovam nos Vinhedos do Monte Agudo

As irmãs Carolina Rojas Ferraz e Patricia Rojas Ferraz estão à frente dos Vinhedos do Monte Agudo. Carol é enóloga e Patty atua na área comercial e marketing da vinícola. Elas ingressaram na área após o pai, o médico pediatra Leônidas Ferraz, fundar a vinícola junto com o produtor de grãos Alceu Muller. Os 55 hectares de terra foram comprados em 2004, um ano depois foram implantadas mudas da França, em 2008 saiu a primeira safra e em 2011 os primeiros vinhos foram engarrafados. “A gente entrou nisso não sabendo nada, a empresa estava ali, alguém tinha que assumir, e de um vinhedo a Monte Agudo se tornou o que é hoje”, explica Patrícia.

Patty Ferraz como é conhecida na Serra Catarinense é formada em Hotelaria e Sommelier pela ABF. Além de atuar na área comercial e no marketing, também faz atendimentos na vinícola e se orgulha da experiência Enogastronômica oferecida pela vinícola. Tudo começou no final de 2012 quando as irmãs decidiram fazer piqueniques, no meio dos vinhedos, pois não tinham estrutura para receber os turistas. Hoje, com um espaço específico para recepcionar os visitantes, a Monte Agudo é a única vinícola da região que tem uma chef residente, Kátia, que é tia das empresárias e assumiu a cozinha da vinícola em São Joaquim. “Quando eu e minha irmã começamos quase não tinham mulheres e a gente foi criando coisas diferentes para receber o público da forma que gostaríamos de ser atendidas. O nosso piquenique, por exemplo,  tinha uma mesa no meio do vinhedo com uma toalha linda que a gente fez em parceria com uma empresa de tecidos de Brusque. A nossa degustação desde o começo foi feita em taça de cristal ISO, uma taça especial para degustação, colocamos um prato de frios, pães, tudo isso para oferecer experiências.”, relembra Patty.

Para a enóloga Carol, que atua também no campo, a busca por conhecimento e capacitação foi essencial para conquistar o respeito em um mundo que, até então, era praticamente masculino. Sommelier formada pelo Centro Europeu ela também cursou Enologia e Viticultura no IFSC.  “Um grande diferencial das mulheres é ter mais sensibilidade. Aqui na Vinhedos do Mone Agudo nós recebemos grupos de mulheres, inclusive no primeiro fim de semana da Vindima de Altitude, nós recebemos um grupo de 20 mulheres de uma Confraria, que participaram de uma degustação técnica e se identificaram com a gente,com a recepção feita por eu e a minha irmã”. Já Patty, foca em um ensinamento do pai e todos os dias trabalha para fazer o melhor vinho do mundo. “Eu e a Carol estamos dando o nosso melhor e isso faz a diferença”, finaliza Patrícia. 


 

Maristane Greter empreende na Vinícola Fama 

A advogada Maristane Greter é proprietária da mais nova vinícola da Serra Catarinense. A Vinícola Fama é a realização de um sonho do casal Mari Greter e Fabiano Muller, concretizado em uma propriedade com um dos vinhedos mais antigos de São Joaquim onde, em 2002 foram implantadas cepas de Marselan, Malbec, Sagrantino, Rebo, Montepulciano, Sangiovese e Sauvignon Blanc. “A produção de vinho é uma tradição familiar, nossos pais faziam seus vinhos no porão de casa para consumo próprio e, em visita a São Joaquim, nós nos apaixonamos pela Serra Catarinense, pelos vinhedos, e terroir. Decidimos então investir na região abrindo a nossa própria vinícola”. 

Mari é apaixonada por espumantes e, para homenagear todas as mulheres que também apreciam a bebida, deu o próprio nome a um rótulo da vinícola. “As mulheres batalham por espaço, colocam a feminilidade em tudo que fazem e também apreciam os vinhos finos de altitude. Por isso, o Maristane é uma forma de homenagear e representar essas mulheres”. 

A Fama estreia na Vindima de Altitude de Santa Catarina e apesar da pouca idade já traz novidades como a ampliação do vinhedo com novas cepas. “Nos próximos anos nós queremos produzir uvas diferentes e apresentar aos consumidores excelentes vinhos e espumantes. Além de criar um novo empreendimento para unir a enogastronomia com o enoturismo em um só lugar”, finaliza Mari.

Voltar